Quem percorrer Coimbra até 30 de Setembro, encontrará em nove locais da cidade diversos conjuntos de figuras recortadas em tamanho natural, reunidas sob o tema da Crise.
A quem passa, as silhuetas negras que enchem, por exemplo, o Largo da Portagem, parecem adequadas aos tempos magros da actual crise internacional, mas observando melhor, a Crise que essas figuras evocam ocorreu há 40 anos, ou seja, é uma das tais crises que já acabaram.
"A Crise saiu à rua – Um olhar sobre a Academia de Coimbra em 1969” evoca a crise académica de 1969, um marco histórico da Associação Académica de Coimbra, da cidade de Coimbra e da Democracia em Portugal. A Instalação – pois é de uma grande instalação que se trata – foi organizada pela empresa municipal Turismo de Coimbra com a colaboração da AAC e pretende recriar o ambiente vivido na cidade durante a crise, com recurso a figuras e fotografias da época à escala humana, completadas por diversos elementos visuais e sonoros.
Existem núcleos expositivos na Via Latina, Largo D. Dinis e Sala 17 de Abril, Largo da Portagem, Praça da República, antiga sede da PIDE/DGS, edifício da Associação Académica de Coimbra, Av. Sá da Bandeira e na Baixa da cidade, para além de dois núcleos centrais que permitem conhecer a crise estudantil de 1969 (Pateo das Escolas) e o seu contexto sociopolítico (Largo da Sé Velha).
Largo da Portagem - lançamento de balões com palavras de ordem
O descontentamento e inquietação de um grande número de estudantes a propósito da situação do ensino e da guerra colonial, permitiu a eleição de uma lista de unidade antifascista para a direcção da Associação Académica de Coimbra e criou uma tensão acrescida para a aguardada inauguração do Edifício da Matemática.
Na manhã de 17 de Abril de 1969, a Universidade de Coimbra recebeu a comitiva liderada pelo Presidente da República, Almirante Américo Tomás, acompanhado pelos ministros da Educação (José Hermano Saraiva) e das Obras Públicas. O Presidente do Conselho, Marcelo Caetano, encontrava-se ausente de metrópole.
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"A Crise saiu à rua" - manifestantes
A Crise Estudantil de 1969
O descontentamento e inquietação de um grande número de estudantes a propósito da situação do ensino e da guerra colonial, permitiu a eleição de uma lista de unidade antifascista para a direcção da Associação Académica de Coimbra e criou uma tensão acrescida para a aguardada inauguração do Edifício da Matemática.
Na manhã de 17 de Abril de 1969, a Universidade de Coimbra recebeu a comitiva liderada pelo Presidente da República, Almirante Américo Tomás, acompanhado pelos ministros da Educação (José Hermano Saraiva) e das Obras Públicas. O Presidente do Conselho, Marcelo Caetano, encontrava-se ausente de metrópole.
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Durante a cerimónia, o novo presidente da AAC, Alberto Martins (actual líder parlamentar da bancada do PS na AR) pediu a palavra para falar em nome dos estudantes. Após alguma perplexidade e embaraço das autoridades, foi-lhe respondido que falaria após o discurso do Presidente da República, mas Américo Tomás abandonou a sala logo depois de discursar, ignorando o legítimo representante dos estudantes. Estes, indignados, vaiaram o Presidente da República e ministros, acentuando o pretexto para a imediata intervenção da Polícia de Intervenção e Defesa do Estado (PIDE/DGS). O ministro da Educação, José Hermano Saraiva, fez um discurso intimidatório na RTP (ainda a preto e branco, como era então o país), com palavras muito diferentes das que usaria anos depois nos seus programas televisivos, mas as ameaças veladas revelaram-se inúteis, assim como falharam todas as habituais medidas repressivas do regime. Pelo contrário, a violência da sua reacção reforçou a unidade estudantil e a simpatia da população de Coimbra pela revolta dos estudantes, mergulhando a cidade num estado generalizado de desobediência cívica.
"A Crise saiu à rua" - estudantes em protesto
A Associação Académica foi demitida e, a 02 de Junho de 1969, começou a greve aos exames, que terminou apenas em Setembro. A GNR e a PSP foram chamadas a controlar os estudantes, que foram perseguidos, cercados, agredidos, presos e interrogados pela PIDE/DGS. Às cargas de cavalaria da GNR, pelotões de choque, jipes anti-motim, os estudantes respondiam sabotando a acção policial (calçadas ensebadas e armadilhas de pregos para os pneus dos jipes), realizando grandes plenários e desconcertando as autoridades com distribuição de flores à polícia e lançamento de balões com palavras de ordem. O mais grave de tudo, na perspectiva do regime, é que não se tratava de estudantes, no abstracto, mas sim dos filhos das elites nacionais – que então acediam mais facilmente ao ensino liceal e superior. Muitos deles viriam depois a ser incorporados compulsivamente nas Forças Armadas com destino à guerra colonial.
Tentando acalmar a revolta, escolheu-se um professor catedrático da Universidade de Coimbra, José Veiga Simão (n. Guarda, 1929), para substituir José Hermano Saraiva no Ministério da Educação Nacional, e o novo ministro apressou-se a nomear um reitor menos comprometido com os ideais do regime, Gouveia Monteiro. A crise terminou finalmente a 11 de Abril de 1970, quando uma comissão de estudantes presidida pelo mesmo Alberto Martins foi a Lisboa pedir a “compreensão e benevolência” do Chefe de Estado, com o apoio do novo Reitor, que fez um discurso apaziguador, e de professores como Paulo Quintela, Teixeira Ribeiro e Sebastião Cruz. Há quem considere vexatória e patética a missão de retratação liderada por Alberto Martins, mas urgia restituir a paz à Universidade, evitando maiores danos para a secular instituição e para os estudantes, que acabaram por ser amnistiados. De resto, a coragem dos estudantes abriu caminho ao espírito de Abril e a escolha de Veiga Simão para Ministro da Educação revelou-se acertada – para resolver a crise estudantil de 1969 (pois outras houve, como a revolta estudantil de 1907, ou o Luto Académico de 1962) mas sobretudo para impulsionar o ensino público em Portugal.
A Associação Académica foi demitida e, a 02 de Junho de 1969, começou a greve aos exames, que terminou apenas em Setembro. A GNR e a PSP foram chamadas a controlar os estudantes, que foram perseguidos, cercados, agredidos, presos e interrogados pela PIDE/DGS. Às cargas de cavalaria da GNR, pelotões de choque, jipes anti-motim, os estudantes respondiam sabotando a acção policial (calçadas ensebadas e armadilhas de pregos para os pneus dos jipes), realizando grandes plenários e desconcertando as autoridades com distribuição de flores à polícia e lançamento de balões com palavras de ordem. O mais grave de tudo, na perspectiva do regime, é que não se tratava de estudantes, no abstracto, mas sim dos filhos das elites nacionais – que então acediam mais facilmente ao ensino liceal e superior. Muitos deles viriam depois a ser incorporados compulsivamente nas Forças Armadas com destino à guerra colonial.
Tentando acalmar a revolta, escolheu-se um professor catedrático da Universidade de Coimbra, José Veiga Simão (n. Guarda, 1929), para substituir José Hermano Saraiva no Ministério da Educação Nacional, e o novo ministro apressou-se a nomear um reitor menos comprometido com os ideais do regime, Gouveia Monteiro. A crise terminou finalmente a 11 de Abril de 1970, quando uma comissão de estudantes presidida pelo mesmo Alberto Martins foi a Lisboa pedir a “compreensão e benevolência” do Chefe de Estado, com o apoio do novo Reitor, que fez um discurso apaziguador, e de professores como Paulo Quintela, Teixeira Ribeiro e Sebastião Cruz. Há quem considere vexatória e patética a missão de retratação liderada por Alberto Martins, mas urgia restituir a paz à Universidade, evitando maiores danos para a secular instituição e para os estudantes, que acabaram por ser amnistiados. De resto, a coragem dos estudantes abriu caminho ao espírito de Abril e a escolha de Veiga Simão para Ministro da Educação revelou-se acertada – para resolver a crise estudantil de 1969 (pois outras houve, como a revolta estudantil de 1907, ou o Luto Académico de 1962) mas sobretudo para impulsionar o ensino público em Portugal.
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