quarta-feira, 29 de abril de 2009

Prémio EDP Novos Artistas distingue Gabriel Marques e Mauro Cerqueira


Foi anunciado a 20 de Abril o vencedor do 8º Prémio EDP Novos Artistas, que pretende “incentivar o surgimento de novos criadores e, assim, manter e estimular os nossos valores do futuro”. Sem surpresa, o prémio foi atribuído ao jovem artista luso-americano Gabriel Marques.

Era praticamente impossível a um júri internacional (1), composto por personalidades habituadas a detectar os tais “valores do futuro” e a gerir em conformidade as tendências internacionais da arte actual, ignorar o currículo internacional e a modernidade do projecto de Gabriel Marques. Os restantes oito candidatos (2) ao prémio de 10.500 euros, apesar do interesse e valor intrínseco dos seus projectos, concorriam com assinalável desvantagem. Para além de mobilizar múltiplas linguagens contemporâneas (desenho, pintura, cinema, instalação, performance), Gabriel Marques reordena a realidade através de temas incómodos e polémicos da actualidade, com o objectivo de chocar os costumes e baralhar as consciências bem comportadas. Nem por acaso, o júri achou importante salientar a sua capacidade de criação de universos narrativos, assim como a energia criativa do projecto – e não por causa da energia eléctrica do prémio.

A energia é um termo adequado à vida e obra, para já, do franzino jovem nascido de pais africanos em Chapel Hill, Carolina do Norte, EUA, em 1984. Estudou cinema e artes plásticas na Cooper Union for the Advancement of Science and Art, em Nova Iorque, até 2006, frequentando depois a École Nationale des Beaux-Arts, em Paris, e o Le Fresnoy - Studio National des Arts Contemporains, em Tourcoing, França. Reside e trabalha actualmente em Lisboa. Expõe individualmente em Lisboa e Porto desde 2006, na Galeria 111 e na Houghton Gallery, em Nova Iorque. Participou em exposições colectivas em Portugal (Algés, Viana do Castelo, São João da Madeira), EUA (Washington, Miami), Londres, Berlim e Viena.

Assume-se como cineasta-artista, reconhecendo que se dedicou à arte para poder fazer filmes: “o cinema (…) foi a razão principal que me levou a trabalhar em arte” – ver artigo do Jornal de Letras e entrevista à Arte Capital. O seu filme Visionary Iraq participou no Festival Indie Lisboa (24 de Abril, no Cinema São Jorge, dias 26 e 30, no Cinema Londres) e cenas de alguns dos seus filmes foram integrados numa entrevista ao programa Fotograma, da RTP (12 de Abril de 2009).

O júri decidiu ainda atribuir merecidamente uma menção honrosa (o que acontece pela primeira vez) a Mauro Cerqueira, um jovem artista de 27 anos nascido e formado em Guimarães (licenciatura em artes e desenho pela Escola Superior Artística do Porto e bacharelato em pintura pela Escola Superior Artística do Porto, ambas na extensão de Guimarães), com uma obra bem sugestiva ao nível da encenação do real, experimentação de percursos absurdos e exploração de ritos e ritmos quotidianos, mas sem o “background” americano de Abrantes.

A proposta que o artista-músico (pela sua ligação a diversos projectos de música alternativa) Mauro Cerqueira apresentou a concurso exibia ao mesmo tempo, lado a lado, o registo vídeo de uma performance (o corte de painéis brancos com uma faca) e os referidos painéis.

Resumindo, o prémio e a menção honrosa foram bem atribuídas, verificando-se que a condição de artista “estrangeirado” pesa na atribuição do prémio EDP Jovens Artistas, considerando a experiência estrangeira dos premiados até à data (3), a começar naturalmente pela Joana Vasconcelos. Uma condição naturalmente prevista no regulamento do prémio, dirigido a artistas portugueses, residentes ou não em território nacional, e a artistas estrangeiros que residam em Portugal. Mesmo assim, sublinhe-se a enorme responsabilidade que pesou sobre o júri de selecção, cuja tarefa foi reduzir de 410 artistas admitidos a concurso para apenas nove o número de potenciais candidatos ao prémio.

Resta saber se, como escreveu Octávio Paz, a propósito dos prémios literários, “Os prémios domesticam o escritor independente, cortam as asas ao inspirado, castram o rebelde”? Ou seja, a rebeldia resistirá à consagração do artista na praça pública? Só o tempo o dirá.


(1) O júri do 8º Prémio EDP Novos Artistas foi constituído por José Manuel dos Santos (Director da Fundação), Bartolomeo Marí (Director do MACBA – Museu de Arte Contemporânea de Barcelona), Agnaldo Farias (Instituto Tomie Ohtake, São Paulo), Miguel von Haffe Pérez (crítico de arte e consultor da Fundação Ilídio Pinho, Porto) e Pedro Calapez (Artista Plástico vencedor do Prémio EDP.Arte/Pintura em 2001).
(2) Para além de Gabriel Abrantes (vídeo, pintura, fotografia), foram seleccionados António Bolota, (escultura), Bruno Cidra (escultura), Gonçalo Sena (desenho, instalação), Hernâni Gil (vídeo performativo), Margarida Paiva (vídeo), Mauro Cerqueira (escultura, instalação), Nuno Rodrigues de Sousa (pintura e vídeo) e Sónia Almeida (pintura), de entre 410 candidatos. Cada um destes nove artistas recebeu 2.500 euros para criar uma obra ou desenvolver um projecto, divulgados na exposição que decorre no Museu da Electricidade, em Lisboa, até 10 de Maio de 2009.
(3) O Prémio EDP Novos Artistas foi instituído em 2000 e já distinguiu os seguintes artistas: Joana Vasconcelos (2000), Leonor Antunes (2001), Vasco Araújo (2002), Carlos Bunga (2003), João Maria Gusmão/Pedro Paiva (2004), João Leonardo (2005), André Romão (2007). Em 2006, o prémio não foi atribuído e, a partir deste ano, será bienal.

Fontes, para além das indicadas no texto: Lusa, 22/12/2008; DN de 27 de Março 2009; revista Sábado nº256, 26 de Março a 1 de Abril de 2009; revista Visão 23 de Abril de 2009.

segunda-feira, 27 de abril de 2009

AFONSO HENRIQUES - 900 ANOS (1109-2009)

Estátua de D. Afonso I em Guimarães, de Soares dos Reis (1887)


Várias cidades do país comemoram em 2009 os 900 anos do nascimento de D. Afonso Henriques, fundador da nacionalidade e primeiro rei de Portugal.

Guimarães é o palco privilegiado destas iniciativas, mas outras cidades indissociáveis da vida de Afonso Henriques e da fundação da nacionalidade, como Viseu e Santarém, também se associam às comemorações.


Em Guimarães, sob o lema “900 anos, 900 horas”, as mais diversas instituições da cidade, evocam o nascimento, a vida e a obra de D. Afonso Henriques: Biblioteca Municipal Raul Brandão, o Arquivo Municipal Alfredo Pimenta, a Sociedade Martins Sarmento, o Museu de Alberto Sampaio e o Paço dos Duques de Bragança, para além da Câmara Municipal de Guimarães, que coordena o programa, e de quase todas as escolas do concelho.


O programa iniciou-se em Janeiro, com a 1ª Mostra de Música Moderna de Guimarães, e terá o seu ponto alto a 24 de Julho, com a cerimónia de homenagem a D. Afonso Henriques, que será presidida pelo Presidente da República.

Este intenso e exigente programa comemorativo em Guimarães serve ainda para preparar a Capital Europeia da Cultura de 2012.

Na apresentação do programa das comemorações, foi ainda anunciado o regresso da estátua de D. Afonso Henriques ao seu local primitivo, nos jardins da Alameda de S. Dâmaso. A estátua é da autoria de Soares dos Reis, considerado o maior escultor português do século XIX, que a realizou em 1887. Em Lisboa, no Castelo de S. Jorge, existe uma réplica da estátua de Soares dos Reis, oferecida pela cidade do Porto e inaugurada em 1947.

terça-feira, 21 de abril de 2009

OBRAS DE ARTE EM SEIA - 7


Dorita de Castel-Branco: Estátua de Afonso Costa

A menos de ano e meio das comemorações do centenário da República, evoquemos o senense Afonso Costa, o dirigente político que mais marcou a vida da I República até ao sidonismo. Chefe (“Presidente do Ministério”) de três governos republicanos, entre 1913 e 1917, duas vezes ministro (Finanças e Justiça), escolheu o exílio após o golpe de Sidónio Pais (5 de Dezembro de 1917). Ver busto da autoria de António Paiva e breve biografia publicada pela Assembleia da República.

Casa onde nasceu Afonso Costa (demolida nos anos 60) - desenho de Júlio Vaz Saraiva
Apesar de afastado da vida política nacional, Afonso Costa prestou importantes serviços à República no estrangeiro, como chefe da delegação portuguesa à Conferência da Paz e à Sociedade das Nações, chegando a presidir à assembleia geral da Sociedade das Nações.
Foi, aliás, uma das derradeiras esperanças dos republicanos para a salvação do regime, tendo sido convidado a formar governo no final de 1923, pelo recém-eleito presidente da República, Teixeira Gomes, mas a falta de apoio dos nacionalistas levou-o a regressar a Paris. Colaborou depois com outros exilados na Liga de Defesa da República, criada para combater internacionalmente a ditadura nascida do 28 de Maio de 1926.
Terá visitado Seia pela última vez no final de 1923 ou no início de 1924. Em 1971, no centenário do seu nascimento e 34 anos após a sua morte no exílio (Paris, 01 de Maio de 1937), vieram para o jazigo da família, em Seia, os restos mortais do político republicano (Seia Católica, Nº 424, Julho de 1971; Monografia de Seia, pág. 334).
Dez anos depois (08 de Novembro de 1981) foi inaugurada a sua estátua em Seia, pelo então Presidente da República, General Ramalho Eanes. Era Ministro da Cultura, Francisco Lucas Pires. Uma foto de Eanes discursando, da autoria do fotógrafo senense Serafim Correia, foi então capa do jornal “Diário de Notícias”.
Ainda sobreviviam, na época, alguns ressentimentos em relação às políticas anticlericais de Afonso Costa e ameaças anónimas impuseram a necessidade de guarda armada à estátua durante a noite.


DORITA
De aspecto frágil e sensível – muito diferente da figura tradicional do escultor, Dorita Castel-Branco afirmou-se como escultora de corpo inteiro, capaz de lidar criativamente com os materiais brutos da escultura, a pedra, o ferro, a madeira, para produzir a pequena peça, a medalha precisa e delicada, ou o grande conjunto escultórico destinado à praça pública. “Moça frágil, desmedido escultor” – assim a classificou Jorge Amado, após uma visita ao seu atelier, em 1982.
Em 1981, Dorita marcara o ano artístico graças à inauguração de duas importantes obras de sua autoria: o conjunto escultórico dedicado aos Emigrantes, no largo fronteiro à estação de Santa Apolónia, em Lisboa, e um grande monumento na ilha de Taipa, em Macau. Em Novembro, foi inaugurada em Seia a estátua de Afonso Costa.
No ano seguinte, a 20 de Dezembro, é inaugurado o Monumento ao Centenário da Cidade da Figueira da Foz, de sua autoria, na Rotunda do Centenário. A medalha comemorativa dos 100 anos da cidade também foi realizada pela escultora.
Para além da linguagem específica das formas (estilizadas, geometrizadas, muitas vezes exprimindo movimento) o que sobressai das suas obras é uma grande força interior. A sua obra criativa é muito vasta e as suas esculturas públicas (34 esculturas ou conjuntos escultóricos implantados em jardins e praças ou edíficios públicos), encontram-se dispersas por todo o país, no antigo território de Macau (Ilha da Taipa), no Brasil (Embaixada de Portugal em Brasília e Rio de Janeiro) e na Venezuela (Embaixada de Portugal em Caracas).
“A escultura de Dorita rejeita todos os elementos vinculados à escultura tradicional. Num trajecto que parte da figuração para a essencialidade da forma, o seu projecto artístico baseia-se num processo de simplificação gradual da figura, esquematizada e descaracterizada, até atingir uma síntese plástica não figurativa, inserindo-se numa tendência cada vez mais forte para a forma pura, perceptível e abstracta.” Prof.José Fernandes Pereira, in Dicionário de Escultura Portuguesa ,2005.
Dorita de Castel-Branco nasceu em Lisboa a 13 de Setembro de 1936. Em 1962, concluiu o curso superior de escultura na escola superior de Belas Artes de Lisboa. Em 1963 e 1964, frequentou em Paris a “École Supérieure de Beaux Arts” e a “Académie de Feu de Paris” com uma bolsa da Fundação Calouste Gulbenkian,


Começou a expor em 1965, tendo realizado 25 exposições individuais em diversos espaços e galerias e participou em mais de uma centena de mostras colectivas, em Portugal e no estrangeiro.
Foi distinguida com diversos prémios – entre os quais o o 1º prémio da II Bienal Internacional del Deport, em Barcelona (1969) e o 1º Prémio Edinfor de Escultura (1993).
Professora do ensino liceal a partir de 1962, nos liceus D. Leonor, D. João de Castro e Maria Amália Vaz de Carvalho e nas escolas secundárias Patrício Prazeres e António Arroio, exercendo a docência durante 34 anos, em simultâneo com a actividade artística.
Faleceu em Lisboa em 23 de Setembro de 1996.
Está representada nos museus Nacional de Arte Moderna e Antoniano de Lisboa, Fundação Calouste Gulbenkian de Lisboa e Paris, Biblioteca Nacional de Lisboa e Museu Regional de Aveiro.
Em 2007, foi homenageada com uma grande exposição no Casino Estoril.
O espólio de Dorita Castel-Branco está a cargo da Câmara Municipal de Sintra, em exposição na Casa Dorita Castel-Branco, localizada na Quinta da Regaleira.
Fontes: Dicionário de Pintores e Escultores Portugueses, Fernando de Pamplona, Livraria Civilização, Vol. II; Catálogo da Exposição de Homenagem a Dorita - Galeria de Arte do Casino Estoril, 2007; Correio da Manhã, 14 Fevereiro 2007, “Casino inaugura exposição de Dorita Castel’Branco”.
NB: as fotos deste post foram actualizadas em 2010, após as obras de limpeza e restauro do monumento realizadas pela CMS no âmbito das comemorações do Centenário da República.

No 35º Aniversário da Revolução dos Cravos


Trinta e cinco anos após o 25 de Abril de 1974, recordemos a Revolução dos Cravos (uma das mais pacíficas revoluções da História Universal) através de imagens e sons incontornáveis:

- O início do movimento foi anunciado no Rádio Clube Português pela senha 1 - a canção "E Depois do Adeus" (letra de José Niza e música de José Calvário), interpretada por Paulo de Carvalho no Festival Eurovisão da Canção.

- Para confirmar o movimento utilizou-se a senha 2 - a canção "Grândola Vila Morena" (letra e música de Zeca Afonso).

- Comunicado do posto de comando do Movimento das Forças Armadas - MFA.

- O herói de Abril, Salgueiro Maia, ocupa o Terreiro do Paço e cerca o Quartel do Carmo. Foram os momentos mais delicados da Revolução.

- Proclamação da Junta de Salvação Nacional, lida pelo General António de Spínola. Estava consumada a Revolução dos Cravos.

segunda-feira, 13 de abril de 2009

250º Aniversário da Cidade de Aveiro

Cidade começou por se chamar Nova Bragança

Foto: www.uc.pt

Este ano, passam 1050 anos sobre a primeira referência escrita a Aveiro (doação testamentária da condessa Mumadona Dias do mosteiro de Guimarães, 26 de Janeiro de 959), e comemoram-se os 250 anos da sua elevação a cidade (1759), por D. José.

Na origem deste acontecimento esteve a condenação à morte do último duque de Aveiro, por traição, motivo que levou a nova cidade a ser então baptizada como Nova Bragança. Uma vez esquecido o lamentável episódio, que ajudou ao mau nome do Marquês de Pombal, a cidade voltou a denominar-se Aveiro.

Considerada “a Veneza portuguesa”, por comparação dos seus canais e barcos típicos, moliceiros e bateiras, aos canais venezianos e às típicas gôndolas, é terra de salinas, vareiras e ovos moles.
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Realiza anualmente a grandiosa Feira de Março, cuja origem remonta a 1434, ano em que D. Duarte concedeu às suas gentes o privilégio de ter uma feira franca anual. Em 1515, recebeu o seu primeiro foral.
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Outra data importante é a do feriado municipal, a 12 de Maio, que recorda a morte da Infanta D. Joana (filha do rei D Afonso V) no Convento de Jesus, nesse dia do ano de 1490. A estadia da Infanta em Aveiro, entre 1472 e 1490 deu relevo e proporcionou o desenvolvimento da vila.
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Caetano Veloso dedicou a Aveiro uma faixa do seu álbum mais recente, "Zii e Zie", lançado em Portugal a 20 de Abril de 2009. A faixa intitula-se "Menina da Ria", evocando "Menino do Rio", trinta anos depois.

No que me diz respeito, Aveiro era (é) capital de distrito da terra onde passei parte da infância e juventude, Santa Maria da Feira (então Vila da Feira). Na Escola Secundária José Estêvão, em Aveiro, realizei os exames de acesso à Universidade, e aí vivi no primeiro ano em que dei aulas, em Ílhavo, no ano lectivo de 1980/81.
No Museu da Cidade de Aveiro, decorre até 12 de Maio uma exposição sobre a história da cidade, intitulada "B.I. - Aveiro".

quinta-feira, 9 de abril de 2009

JOAQUIM PINTO - Um artista senense em Newark

Pintura de Joaquim Pinho - "New York City Hall/Câmara Municipal de Nova Iorque"
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Em 1999, a I Exposição Colectiva de Artistas Senenses foi uma agradável surpresa para quem julgava Seia um vazio de artes e de artistas. De então para cá, as exposições colectivas de artistas senenses e depois a ARTIS – Festa das Artes e Ideias em Seia, vêm acrescentando mais e mais artistas a esse significativo número inicial, e outros vão sendo revelados ou (re)descobertos. No primeiro caso, temos por exemplo um Renato Paz, que Mário Jorge Branquinho deu a conhecer recentemente no seu blog www.seiaportugal.blogspot.com. No segundo caso, os artistas que residem longe da sua terra natal e por cá vão sendo lembrados e revisitados a pretexto de uma notícia, um contacto, uma efeméride. Este é o caso de Beto Cruz ou de Joaquim Pinto.

No ano passado, recuperei uma antiga informação de Tavares Correia, sobre a existência de um senense emigrado nos EUA que também se dedicava à pintura, de nome Joaquim Pinto, natural de Girabolhos. Graças ao professor José Alberto Silva, de Girabolhos, consegui a sua morada, em Kearny, New Jersey. Recebi ontem uma resposta simpática de Joaquim Pinto, com alguns dados biográficos e fotografias dos seus quadros.

Joaquim Guilherme Correia Pinto nasceu na freguesia de Girabolhos, concelho de Seia, a 30 de Agosto de 1942.

Na sua juventude, em 1956/57, trabalhou nos testes de subsolo com vista à construção da barragem do Rio Mondego, entre Girabolhos e Abrunhosa (Currais).

Em 1959, com 17 anos, emigrou para o Brasil. Instalou-se em São Paulo seis meses antes da inauguração da nova capital federal, Brasília. Aí, frequentou o Instituto Foto Cine Bandeirante, mas não chegou a terminar o curso pois os negócios levaram-no a mudou-se para Santos.

Após viver 10 anos no Brasil, resolveu tentar a sorte nos EUA. Chegou a Newark em Março de 1970, com um contrato de trabalho como cortador de carnes. Casou um ano depois, tendo três filhos (Sílvia, Suelly, António) e uma neta (Raquel).

Em 1974, na palestra de abertura de uma escola de pintura em Newark, ficou impressionado com uma demonstração de pintura ao vivo do pintor Manuel Roça e decidiu começar a pintar.

Parente de Tavares Correia (a sua avó era prima direita dos pais de Tavares Correia e do pai do Dr. Guilherme) recebeu do Mestre senense algumas orientações, perceptíveis nas suas obras. Quando Tavares Correia fez 90 anos, veio propositadamente dos EUA para comemorar a data e visitar a sua última exposição, a “exposição do Adeus”.

As paisagens de Joaquim Pinto imitam os parâmetros tradicionais, acrescidos de um sabor popular na selecção dos temas e tratamento “naïf” das formas, sobretudo nas obras mais antigas, como “Lincoln Tunnel” – pintado por ocasião do 200º aniversário dos EUA, em 1976). Quadros como “New York City Hall” (“Câmara Municipal de Nova Iorque”, I e II – com sombras) revelam uma maturidade técnica muito interessante, com a preocupação de captar os efeitos da luz do dia em dois momentos diferentes. Entre as diversas paisagens que pintou, contam-se algumas vistas da sua terra natal, Girabolhos.

O tema dos Descobrimentos mereceu igualmente a atenção de Joaquim Pinto, admirador dos feitos náuticos dos portugueses, inspirando-o na pintura de boas marinhas (“Velas ao Vento”, com excelentes pormenores técnicos contrastando com o exagerado velame da caravela, e “Sagres”).

Em Maio, a ARTIS permitirá (re)fazer o balanço da situação das artes em Seia, apesar de limitada devido às obras que fecharam a Casa da Cultura. No entanto, será sempre oportuno trazer a primeiro plano artistas – e outras pessoas – que projectam extra-muros o nome e as riquezas senenses, sejam elas naturais, patrimoniais ou humanas.

Pintura de Joaquim Pinto - "Lincoln Tunnel", 1976



Pintura de Joaquim Pinto - "Velas ao Vento"

quarta-feira, 8 de abril de 2009

Entre a Terra e o Céu - Fotografia de Carlos Marques


Encontra-se patente desde o início do mês de Abril, no Foyer do Cine-Teatro da Casa Municipal da Cultura, uma exposição de fotografia de Carlos Marques, intitulada “Da Serra e do Mar”.

Composta por 16 fotografias a preto e branco e 13 a cores, a exposição é bastante interessante (se abstraimos do objectivo indicado, "mostrar a diferença das tonalidades obtidas nas diferentes horas do dia") pois dá-nos a ver dois grupos de fotos diametralmente opostos:

- fotos a preto e branco / mar / homem presente / faina;
- fotos a cores / serra / homem ausente / paisagem.

No primeiro grupo, sem cor, assistimos a uma série de imagens da faina da pesca com arte da xávega. Nessa técnica ancestral, as redes são lançadas a curta distância da praia por um barco e depois puxadas para terra com a ajuda de bois e à força de braços. Praticamente extinta, a arte da xávega encontra-se muito ligada à história das comunidades piscatórias do litoral Norte e centro, pautada por constantes tragédias familiares originadas pelos naufrágios. Nessas comunidades, o ambiente psicológico continua a ser, em boa medida, a preto e branco, e o preto não é apenas a cor do luto mas sobretudo a marca da tragédia.

A embarcação que aparece nas fotos a romper as ondas é uma versão reduzida do extinto “barco do mar”, possante e bojudo, com quilha em forma de meia-lua e proa elevada, característico do litoral centro, de Espinho a Mira. Parece-me que as fotos foram tiradas no Furadouro.

A serra também tem recantos físicos e psicológicos a preto e branco, para não falar nos inevitáveis contrastes das paisagens nevadas, que também inegram a exposição. Porém, o contraste destacado por Carlos Marques mostra as cores da serra em fotos que nos fazem lembrar certas tardes da Primavera serrana. Algumas delas são, de facto, imagens belíssimas a propósito da serra - como as primeiras, a propósito do mar.

Convirá notar que a água é um elemento (quase) omnipresente, servindo de elo de ligação entre os dois conjuntos de fotografias. Num extremo, o mar imenso e profundo. No outro, os rios e lagos cuja superfície espelhada reflecte o envolvimento das margens e o tecto celeste. Nas belíssimas fotos em que a água do canal/levada funciona como um espelho, reflectindo o arvoredo e duplicando o céu, revela-se até ao mais distraído dos observadores uma surpreendente interactividade dos mundos: o real, o seu reflexo e a representação de ambos (nas fotografias de Carlos Marques) mais a negação de tudo isso (o vazio, o caos), não só coexistem como se explicam mutuamente.

Carlos Manuel Rodrigues Marques nasceu em Salreu, Estarreja, em 1954.
Frequentou vários cursos e workshops de fotografia.
Prefere a fotografia de natureza e paisagem.
A sua paixão pela fotografia levou-o a formar um Clube de Fotografia com alguns amigos, em 2002.
Várias exposições individuais e colectivas.
Os seus trabalhos receberam duas Menções Honrosas nos concursos “Ambiente em Imagens”, uma iniciativa da Câmara Municipal de Estarreja.