sábado, 20 de abril de 2013

Sandomil

Entre ecos de antigos pergaminhos e a promessa do turismo que tarda em chegar

Campos de Sandomil, abril de 2013

Sandomil, 19 de abril 2013: os montes verdes do vale do Alva em manhã de sol, com a Serra da Estrela como fundo, as águas do irrequieto Alva murmurando aos nossos pés, os socalcos dos vinhedos em terras altas, ao abrigo das cheias de inverno, o solo recortado em panos terrosos e vegetais.

O rio Alva é o pequeno Nilo da região, o bem mais precioso desta gente teimosamente trabalhadora, agarrada à terra pelo suor e pelo pão. Pacato e quase omisso no verão, galga furiosamente as margens no inverno, ensopando a terra, despertando o húmus. A terra é tão fértil que até as estacas do plantio florescem, não é preciso lutar com a natureza para lhe extrair bons frutos – e por isso é famosa a vocação agrícola de Sandomil.

Em 2009, foi anunciada com pompa a criação do Museu da Agricultura e da Alimentação no arruinado Solar dos Condes de Sandomil. De acordo com notícias da época, publicadas em vários jornais regionais e até nacionais, o anunciado espaço museológico pretendia “recriar de forma interativa a história da alimentação, exercendo alguma pedagogia sobre os comportamentos alimentares”. Atualmente, apenas se conhece em Sandomil o “museu agrícola” do Sr. Rui Mendes, que guarda em sua casa uma vasta coleção particular de alfaias agrícolas e outras ferramentas do agro.

Também se falou em tempos do projeto de um museu da água para o Solar dos Condes de Sandomil, mas a jóia sandomilense no rio Alva é a ponte “romana” (um belo exemplo de engenharia medieval, cujo tabuleiro em cavalete é suportado por quatro arcos de volta perfeita com talha-mares) e a beleza da paisagem envolvente, onde existe uma boa praia fluvial. Recebeu, aliás, a Bandeira Verde do Instituto Nacional da Água em meados dos anos 90 e a Bandeira Azul em 2012, após importantes obras de requalificação.

De resto, não faltam nas margens frondosas e frescas do Alva, praias fluviais, parques de merendas, recantos bucólicos, convidando ao pacato usufruto da natureza, por S. Gião, Penalva do Alva, S. Sebastião da Feira, Caldas de S. Paulo, Ponte das Três Entradas, e por ali fora, passando Avô e Coja, até encontrar o Mondego em Porto da Raiva.

Sandomil também é terra de gente nobre. Os antigos senhores de Sandomil (e de Loriga) descendiam da nobreza nortenha de Ribadouro. Dada por D. Afonso Henriques a D. João Viegas Ranha de Baião (1), em 1131, pertenceu aos seus descendentes nos séculos seguintes, ajudando a estabelecer alianças entre famílias, como dote ou honraria, tendo sido elevada a vila no séc. XVI.

Os condes de Sandomil, título criado em 1720 por D. João V, eram parentes dos duques de Aveiro, do conde de Alva e dos marqueses de Fronteira, Gouveia e Alorna, com quem partilharam o sangue e o destino desde o primeiro conde de Sandomil, D. Pedro de Mascarenhas - descendente de uma família fidalga de Alcácer do Sal. O brasão da família exibia símbolos de poder e riqueza (2) e o conde chegou a Vice-Rei da Índia, embora por pouco tempo (1732-1740) - devido à idade avançada e dificuldades encontradas.

O palácio dos condes de Sandomil em Lisboa foi um dos poucos que resistiu ao terramoto de 1755 e o título também sobreviveu à cruel perseguição dos Távora por parte do futuro Marquês de Pombal. O primeiro conde havia casado com D. Margarida Juliana de Távora e morrera em 1745, sem descendência, deixando os bens e o título a um sobrinho, Fernando Xavier de Miranda Henriques.

O terceiro conde de Sandomil não deixou descendência. Foi seu herdeiro Gama Lobo Salema, um parente afastado, e o título perdeu-se. Como curiosidade, acrescente-se que a atriz Rita Salema (n. Lisboa, 1966) descende dos senhores de Sandomil pelo lado do bisavô.

Notas:

(1)-Senhor de Sandomil e Loriga por carta de 16 de maio de 1131, descendia de Ermigio Viegas, Senhor do Ribadouro, e era parente de Egas Moniz. O seu irmão, Pedro Viegas de Baião, foi o primeiro Alcaide-mor de Lisboa. João Ranha deixou Sandomil à filha, Maria Anes de Baião, cujos descendentes herdaram do marido, Pedro Nunes de Baião, a alcunha “Gato velho”. Afonso Peres “Gato velho” foi senhor de Sandomil 
e sua irmã, Teresa Pires “Gato velho” entrou por casamento na linhagem dos condes de Paris.

(2)-O  timbre do brasão do primeiro conde era um leão de púrpura, armado e lampassado de ouro, escudo púrpura atravessado por 3 faixas de ouro. O segundo brasão dos Condes de Sandomil apresenta o escudo partido em Miranda e Henriques e o timbre é uma coroa de conde. O solar em Sandomil exibe o primeiro brasão.

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