Nota do auctor: texto escripto de accordo com as bases orthographicas da lingua portugueza anteriores á reforma de 1911. O vocabulario actual foi mantido, para maior clareza da escripta.
Accordos orthographicos ha muitos! Volta, Bordallo, e traz os manguitos!
Desde o dia de hoje, 2 de Janeiro de 2012, os escriptos officiaes da Republica Portugueza passam a ser redigidos segundo o novo accordo orthographico, assignado em Dezembro de 1990 pelos principaes paizes de lingua official portugueza. Apesar desse facto, o accordo continua com caracter facultativo, para allem de permitir uma enormidade de duplas graphias. Ou seja, ha 20 annos que discutimos o accordo, adiando successivamente a sua entrada em vigor, para continuarmos na pratica a escrever como nos apetece. Muitos escriptores e jornalistas recusam adoptal-o e praticam o portuguez que aprenderam na eschola (entre outras cousas que entretanto mudaram ou foram mudadas), allegando que o novo accordo é um attentado á lingua lusa, ao portuguez de Portugal, ás proprias raizes culturaes nacionaes. Ora eu reprovo todo e qualquer attentado, não me imagino a attentar contra seja o que for, muito menos contra os superiores interesses da lingua nacional, e por este motivo decidi escrever este texto como se escrevia antes da reforma orthographica de 1911, a primeira a ter força de lei em Portugal. Essa reforma visou normalizar e simplificar a escripta do portuguez a ensinar aos alumnos das escholas republicanas, mas a escripta anterior permite perceber como a “pureza e tradição orthographicas” da lingua portugueza foi successivamente simplificada e normalizada ao longo do seculo XX .
Existe um accordo entre paizes lusophonos para acertos de orthographia e, em Portugal, como no Brazil, uma lei de 2008 colocou esse accordo em vigor. No entanto, a lei em Portugal é muitas vezes lettra morta ou mal entendida e por isso os auctores das leis (e do Direito, em geral) recorrem frequentemente ao latim para titularem a sua auctoridade ou para se explicarem, mesmo que o latim seja uma lingua extincta, morta. Nem é por acaso que, á revelia de todas as linguas vivas e accordos orthographicos, os mais modernos tribunaes portuguezes (como o de Gouveia, inaugurado em 2011), continuem a denominar-se “Domus Justitiae”.
Ao contrario do latim da justiça, o novo accordo orthographico não interfere por ahi além na escripta do portuguez de Portugal, muito menos no quotidiano prático dos portuguezes. Ha quem o acuse, em Portugal, de beneficiar interesses geopolíticos e economicos do Brazil, onde o acordo também está longe de ser consensial por acusações identicas. Tal como n’outras reformas (em especial na de 1911, que contou com a opposição de Teixeira de Pascoaes e Fernando Pessoa, por exemplo), doutos escriptores e estudiosos da lingua e cultura nacionaes na actualidade (como Eduardo Lourenço, Maria Alzira Seixo, Mário Cláudio ou Vasco Graça Moura), não descortinam nelle qualquer virtude, notando que os mais doutos e merecedores estudiosos e escriptores não foram previamente chamados a opinar sobre elle. Assim, acusam-o de ser “um chorrilho de asneiras” (V.G.M.), de más intenções e mesmo de illegalidade - o que ninguem teve coragem de dizer, por motivos obvios, em relação à simplificação da escrita imposta pelo Decreto Lei n. 292 de 1938 ou por ocasião do inefficaz accordo orthographico de 1945. Contra os defensores da preservação da origem etymologica das palavras em desfavor da orthographia phonetica, venceu a escripta com base na pronuncia das palavras, no novo accordo tal como na reforma de 1911 – quando desapareceram da escripta em Portugal os echos etymologicos gregos: ph, th, ch (k) e a lettra y, mantendo-se estes na escripta do portuguez no Brazil por falta de um accordo orthographico.
Uma lingua que se preze evolui naturalmente, na cathedra, no pulpito, na feira e na taverna, mas será sempre necessario affeiçoar a norma e negociar accordos para universalizar o seu uso. A opposição ao novo accordo orthographico e mesmo a adherencia contrariada de alguns, birras que se resolverão no tempo, leva a que muitos escrevam como melhor lhes apetece, em portuguez antigo (tal como estou a fazer, ou peor, mas com igual afflicção), ao abrigo do novo accordo ou n’uma escripta mista, meia accordada, descortinando novas graphias e lumieiras estheticas, escriptas criativas. E aquelles que querem e podem, abusando da sua auctoridade intellectual ou editorial, acrescentam aos escriptos alheios as lettras e accentuação que o accordo manda retirar: censuram sem censurar, prohibem sem prohibir, pois a propria lei obriga sem obrigar.
Volta, Bordallo, e traz os manguitos!
Fontes:
Diccionario Encyclopedico da Lingua Portugueza, de Simões da Fonseca, Livraria Garnier, Paris e Rio de Janeiro.
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