terça-feira, 20 de julho de 2010

ANTÓNIO OLAIO E A CÁTEDRA DE SÃO PEDRO

Até 5 de Setembro, a sala de exposições temporárias do Museu Grão Vasco acolhe uma exposição de António Olaio, intitulada “Na Cátedra de S. Pedro”.

Contextualizada pela presença no museu da obra “São Pedro” (1), de Vasco Fernandes (Viseu, 1475-1542), depois conhecido por Grão Vasco, a exposição consta de diversas obras (desenho, pintura e video) concebidas em torno da ideia de cadeira, “cátedra”.
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Vasco Fernandes (Grão Vasco) - “São Pedro”, 1535-1542 e “São Pedro Patriarca” (c. 1535)

Não existe um modelo consensual para a cadeira de S. Pedro, que tem um dia próprio no calendário católico, 22 de Fevereiro. A existência de uma cadeira portátil no Vaticano terá sido já referida no ano 370 pelo Papa São Dâmaso, mas a cadeira guardada na Basílica de S. Pedro em Roma, no relicário construído por Gian Lorenzo Bernini (Altar da Cátedra de São Pedro) em meados do séc. XVII, será afinal o trono de madeira do Imperador Carlos II, o Calvo (823-877). A cátedra de S. Pedro que se pode ver na pintura de Grão Vasco é um trono monumental apropriado à ideia do Papa enquanto chefe e mestre da cristandade, o elo entre o céu e a terra – muito além do trono mais modesto de “São Pedro Patriarca”.

António Olaio apresenta a cadeira enquanto lugar humanizado tornado objecto, estabelecendo correspondências entre a arquitectura, as artes plásticas e a performance. Nesta mostra, o artista prossegue as suas pesquisas em torno da natureza e limites da arte e do artista, começando por expor na sala de entrada, frente a frente, o modelo e a sua representação: pinturas monocromáticas representando cadeiras (de várias épocas e estilos) e as respectivas cadeiras. A presença física e o peso histórico das cadeiras contrastam com a sua representação monocromática, com o artista a re-interpretar os conteúdos funcionais das cadeiras, descentrando primeiro o objecto da forma e da função, e depois libertando-o do seu volume para o re-interpretar através de uma projecção bidimensional. Enquanto a sombra aparece como complemento (embora um pouco autónomo) do objecto nas pinturas, na série de desenhos da segunda sala, a sombra da cadeira paira ou voa acima de uma realidade estereotipada. A re-interpretação da realidade cria novas realidades coexistentes e não apenas o seu duplo.

A personagem da única cadeira "habitada", na primeira sala, regressa na projecção do video que fecha o percurso da exposição - uma revisão do video "KünstlerLeben" (2010). A cadeira como lugar humanizado, de pose e de palco, uma espécie de pedestal ou de trampolim - como escreve o artista, "na assumpção de que cada um de nós terá a sua própria cadeira, como uma espécie de lote unipessoal, sem tecto" (2).
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Para o artista, a essência da arte passa claramente pela transdisciplinaridade proporcionada pela performance, ou no mínimo pelo seu registo, e as cadeiras de António Olaio tornam-se lugar e corpo sensível e comunicativo, bancada de teste e de provocação dos paradigmas contemporâneos.

A única cadeira "habitada" da exposição


António Olaio nasceu em Sá da Bandeira, Angola, em 1963. Reside em Coimbra.
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Curso Superior de Artes Plásticas/Pintura pela Escola Superior de Belas Artes do Porto (1987). Doutoramento pela Universidade de Coimbra - Departamento de Arquitectura da Faculdade de Ciências e Tecnologia (2000). Professor do curso de Arquitectura da Universidade de Coimbra, onde lecciona desde 1991.
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Entre 1987 e 1992 fez parte do grupo musical “Repórter Estrábico” (3), desenvolvendo depois com o músico João Taborda projectos comuns. Trabalha actualmente com a Galeria Filomena Soares.
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Prémio de escultura Repsol (2000) juntamente com os arquitectos Desirée Pedro e Carlos Antunes. A obra encontra-se na Área de Serviço de Penafiel da A4.

Exposições individuais

2010
- "A cátedra de São Pedro", Museu Grão Vasco
- La Prospettiva is sucking reality, Museu do Neo-Realismo, Vila Franca de Xira
2009
- Crying my brains out, Galeria Filomena Soares, Lisboa
- Brrrrain, Culturgest, Lisboa
- LA PROSPETTIVA, Galeria Mario Mauroner, Viena, Áustria
- "Planeta Coimbra", Galeria de Exposições Temporárias do Museu Municipal de Coimbra/Edifício Chiado
2008
- António Olaio, Galeria Mario Mauroner, Viena, Áustria
2007
- I Think Differently, Now that I Can Paint, Centro Cultural Vila Flor, Guimarães
- Singing the art away, Teatro Académico Gil Vicente, Coimbra
2005
- Pictures are not movies, Galeria Filomena Soares, Lisboa
- Under the stars, Galeria Zé dos Bois, Lisboa
2004
- 40 Years in a plane - Kenny Schachter Contemporary, Nova Iorque, EUA
- I'm growing heads in my head, Círculo de Artes Plásticas de Coimbra
2003
- You are what you eat - Centro Cultural Andratx, Palma de Maiorca, Espanha
2002
- What makes a home a house? - Faculdade de Arquitectura da Universidade do Porto
2001
- António Olaio. Slow Motion ESTGAD, Caldas da Rainha
- Mostra antológica no âmbito de Urban Lab, Bienal da Maia 2001
- Foggy days in old Manhattan, Galeria Filomena Soares, Lisboa
2000
- My left hand is changing, Galeria Pedro Oliveira, Porto
1999
- Sunset TVs, Espaço Poste ite, Porto, e Galeria OM, Coimbra
1998
- And this is the drawer where he kept his gun, Galeria OM , Coimbra
- My Home is a logo Círculo de Artes Plásticas de Coimbra
- What do you want for Christmas? Galeria Zé dos bois, Lisboa
1997
- Bambi is in jail, Galeria Pedro Oliveira, Porto
1994
- PostNuclear Country, Galeria Monumental, Lisboa
1993
- Waiting for Christmas, Cìrculo de Artes Plásticas, Coimbra
1991
Ma main, c`est un readymade, Galeria Pedro Oliveira, Porto
1989
- Blaupunkt Blues, Galeria Roma e Pavia, Porto
1998
- Sofás amarelos, vermelhos não são, Galeria do Jornal de Notícias, Porto
1987
- Quem matou a porteira? - Galeria Roma e Pavia, Porto
1985
- Na Atlântida, Galeria Roma e Pavia, Porto
1984
- Graças à luz eléctrica, Cooperativa Árvore, Porto
- Os espelhos não reflectem a imagem de Drácula, Galeria EG, Porto
1983
- Fernão Mendes Pinto visita Marcel Duchamp, Galeria Roma e Pavia, Porto

(1) – Na mesma época (cerca de 1530), Vasco Gonçalves terá pintado “São Pedro Patriarca”, em colaboração com Gaspar Vaz, pintor activo em Viseu pelo menos desde 1522. Essa obra encontra-se no Mosteiro de São João de Tarouca.
(2) - António Olaio, no desdobrável da exposição.
(3) - Para além de António Olaio, vocalista e figura carismática do grupo, a formação original dos “Repórter Estrábico” incluía Paula Sousa (sintetizador, sampler, piano e voz), Paulo Lopes (guitarra), Luciano Barbosa (caixa de ritmos, percussão e voz), José Ferrão (guitarra) e Anselmo Canha (baixo). O seu álbum de estreia, “Uno Dos”, foi editado em 1991. Blitz

2 comentários:

António Olaio disse...

Caro Sérgio,
Fui na recolha de alguns textos na web sobre o meu trabalho que descobri este no seu blog.
Gostei muito da forma atenta como viu a minha exposição no Grão Vasco.
Só queria fazer uma correcção:
O António Olaio declamador é outro. Não o conheço mas sei que é actor e encenador em Almada.
Cumprimentos
António Olaio

Anónimo disse...
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