Encontra-se patente desde o início do mês de Abril, no Foyer do Cine-Teatro da Casa Municipal da Cultura, uma exposição de fotografia de Carlos Marques, intitulada “Da Serra e do Mar”.
Composta por 16 fotografias a preto e branco e 13 a cores, a exposição é bastante interessante (se abstraimos do objectivo indicado, "mostrar a diferença das tonalidades obtidas nas diferentes horas do dia") pois dá-nos a ver dois grupos de fotos diametralmente opostos:
- fotos a preto e branco / mar / homem presente / faina;
- fotos a cores / serra / homem ausente / paisagem.
No primeiro grupo, sem cor, assistimos a uma série de imagens da faina da pesca com arte da xávega. Nessa técnica ancestral, as redes são lançadas a curta distância da praia por um barco e depois puxadas para terra com a ajuda de bois e à força de braços. Praticamente extinta, a arte da xávega encontra-se muito ligada à história das comunidades piscatórias do litoral Norte e centro, pautada por constantes tragédias familiares originadas pelos naufrágios. Nessas comunidades, o ambiente psicológico continua a ser, em boa medida, a preto e branco, e o preto não é apenas a cor do luto mas sobretudo a marca da tragédia.
A embarcação que aparece nas fotos a romper as ondas é uma versão reduzida do extinto “barco do mar”, possante e bojudo, com quilha em forma de meia-lua e proa elevada, característico do litoral centro, de Espinho a Mira. Parece-me que as fotos foram tiradas no Furadouro.
A serra também tem recantos físicos e psicológicos a preto e branco, para não falar nos inevitáveis contrastes das paisagens nevadas, que também inegram a exposição. Porém, o contraste destacado por Carlos Marques mostra as cores da serra em fotos que nos fazem lembrar certas tardes da Primavera serrana. Algumas delas são, de facto, imagens belíssimas a propósito da serra - como as primeiras, a propósito do mar.
Convirá notar que a água é um elemento (quase) omnipresente, servindo de elo de ligação entre os dois conjuntos de fotografias. Num extremo, o mar imenso e profundo. No outro, os rios e lagos cuja superfície espelhada reflecte o envolvimento das margens e o tecto celeste. Nas belíssimas fotos em que a água do canal/levada funciona como um espelho, reflectindo o arvoredo e duplicando o céu, revela-se até ao mais distraído dos observadores uma surpreendente interactividade dos mundos: o real, o seu reflexo e a representação de ambos (nas fotografias de Carlos Marques) mais a negação de tudo isso (o vazio, o caos), não só coexistem como se explicam mutuamente.
Carlos Manuel Rodrigues Marques nasceu em Salreu, Estarreja, em 1954.
Frequentou vários cursos e workshops de fotografia.
Prefere a fotografia de natureza e paisagem.
A sua paixão pela fotografia levou-o a formar um Clube de Fotografia com alguns amigos, em 2002.
Várias exposições individuais e colectivas.
Os seus trabalhos receberam duas Menções Honrosas nos concursos “Ambiente em Imagens”, uma iniciativa da Câmara Municipal de Estarreja.
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