Creio que deixou de haver desculpa para o desconhecimento deste jovem e promissor escritor, para o qual o próprio José Saramago vaticinou, em 2005, um Prémio Nobel da Literatura nos anos vindouros. Um escritor atento, perspicaz, que reflete inteligentemente sobre o mundo atual dispensando as amarras do sentimentalismo e à revelia das tradições literárias. Em certa medida, a sua escrita é experimental, sendo também um dos escritores mais produtivos dos últimos anos (mais de trinta livros em apenas uma década), eclético (romance, poesia, conto, epopeia), muito editado (livros traduzidos e publicados em 44 países) e premiado (mais de uma dezena de importantes prémios literários em Portugal e no estrangeiro).
Com um raciocínio perspicaz e discurso inteligente, Gonçalo M. Tavares disparou algumas frases incomparáveis. Preocupado com a velocidade a que vivemos, o escritor referiu que «abrir um livro é muito semelhante a entrar numa igreja”, “O livro é uma máquina de lentidão”, “Reparar é estar muito tempo parado na mesma coisa. (...). Só reparamos as coisas se repararmos nelas”. Citou depois uma frase de Hans Christian Andersen para sublinhar que vivemos num “mundo quantitativo”, onde “pedimos espírito e respondem-nos com a tabuada” (…) “cada vez mais nos respondem com números”.
“Canções Mexicanas” (Relógio d’Água), resulta da grande paixão do autor pela cultura mexicana e leva-nos até à Cidade do México para nos mostrar, através de uma série de fragmentos narrativos, como a realidade urbana constrói e semeia, na vida das pessoas, rotinas sem sentido, muitas vezes cruéis. Nessa mega metrópole com 20 milhões de habitantes, os desfavorecidos e rejeitados da sociedade não conhecem a esperança nem compreendem a importância que os europeus atribuem à procura da felicidade.
“Short Movies” (Caminho), é uma coletânea de cenas absurdas do quotidiano, cerca de 70 micronarrativas (algumas das quais já publicadas em jornais e revistas) em que se destaca a sua vocação fílmica e o protagonismo da perspetiva da câmara de filmar. Ler para ver. Um pouco na linha de livros como “Centúria – Cem Pequenos Grandes Romances”, de Giorgio Manganelli, “Short Movies” mostra como o olhar se constrói com letras e que as frases são imagens desenhadas pelo escritor na imaginação do leitor.
Gonçalo M. Tavares no Jornal das 8 da TVI.
Entrevista de João Paulo Sacadura (Livraria Ideal, TVI24): Parte 1; Parte 2; Parte 3.
1 comentário:
Às vezes parece que G.M.Tavares sai do centro em que todos andamos às voltas -desnorteadas/desnorteados- e com a lucidez dos marginais, de um observatório privilegiado, nos vai apontando caminhos. Como lhe agradecer?
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