Luiz Morgadinho,
“Reformados de Portugal”, 2011, acrílico s/tela. ©LM
Decorre até
final de outubro, nas galerias da Casa da Cultura, a primeira exposição
individual de Luiz Morgadinho em Seia. Intitulada “Liberdade às Imagens e
Palavras”, a exposição reune 41 obras realizadas nos últimos anos, entre as
quais duas séries de 7 pequenos quadros,“Tudo vê” e “Aldeia”, de 2013. Para
além de uma linguagem plástica própria, deliberadamente fixada na área do
“naïf”, o traço comum destas obras é o seu poder narrativo visual, irreverente
e trocista, aliando uma estrutura comunicativa muito próxima do
"cartoon" ao delírio imagético e culto do bizarro - hoje entendido
como “surrealismo”.
Fundado há
cerca de 90 anos em França por André Breton, o Surrealismo apresentava-se então
como “Automatismo psíquico puro, pelo qual se pretende exprimir, quer
verbalmente, quer pela escrita, ou por qualquer outra maneira, o funcionamento
real do pensamento (…) na ausência do
controle exercido pela razão, sem
qualquer preocupação estética ou moral”.
As novas propostas de apreensão da realidade (1), a irreverência e liberdade
criativa defendidas pelo movimento, em parte herdadas da revolução dadaísta,
agrada sobretudo aos jovens artistas, o que ajudou à difusão internacional do movimento. No entanto, as obras
estranhas dos surrealistas e a personalidade complexa dos principais ideólogos
e artistas do movimento, transformaram o termo “surrealismo” em sinónimo de
estranho, bizarro, absurdo. Em muitos países, os ideais ortodoxos do
Surrealismo adaptaram-se às realidades locais e Portugal não foi exceção.
Alguns artistas sobreviventes do Grupo
Surrealista de Lisboa, de Os Surrealistas e dos grupos do Café Gelo e do
Café Royal, mantiveram aceso o culto do surrealismo original mas o surrealismo
tem recebido, na última década, um forte
impulso renovador de artistas naturais e residentes na região centro. Com boas relações com outros grupos surrealistas,
sobretudo americanos e europeus, alguns destes artistas agruparam-se e viajam
atualmente nas carruagens da frente do surrealismo internacional, expondo em
diversos países da Europa e Américas ao lado dos seus congéneres locais.
Luiz
Morgadinho é um desses artistas, um pintor de inspiração surrealista, ou, como
ele próprio prefere dizer, um "operário plástico do naife e do
bizarro". Em 2012, participou na exposição coletiva internacional
“Surrealism in 2012”, realizada em Reading, EUA, com trabalhos individuais e
obras coletivas executadas em parceria com elementos da Secção surrealista do Mondego. Em 2013, participou
na exposição coletiva itinerante “Somos todos criados pelo amor”, que levou
obras surrealistas a várias cidades da
República Checa.
Natural de Coimbra (1964), Morgadinho reside em Santa Comba de
Seia e dirige a Associação de Arte e Imagem de Seia. Em 2009, foi homenageado
na ARTIS VIII - Festa das Artes e Ideias de Seia e recebeu em 2010 o Prémio
Município de Oliveira do Hospital no âmbito do AGIRARTE 13, pela obra "No
País dos Lambe Botas”. Este título
ilustra adequadamente o posicionamento crítico do artista relativamente ao seu
tempo, como salienta Miguel de Carvalho: “Morgadinho é um desses arcanjos, um
poeta da imagem que se aproxima subtilmente da crítica social e política,
questionando a pertinência e a capacidade simbólica da vida tradicional,
desfigurando profundamente os seus clichés e as suas convenções” (2).
Depois da exposição individual de pintura em Oliveira do
Hospital, “Ontogénese do Quotidiano” e da exposição individual itinerante “Ad
Instar… à semelhança de…”, que esteve patente em Trancoso e na Guarda, Luiz
Morgadinho realiza finalmente uma grande exposição individual em Seia.
Notas:
(1)-Mais do que um movimento artístico, o surrealismo é uma
maneira de ver, sentir e pensar o mundo. A experiência surrealista privilegia a
imaginação, tentando por diversos meios superar a contradição entre
objetividade e subjetividade, conciliar sonho e realidade numa sobre-realidade,
a “surrealidade” (“surrealité”). Ou, nas palavras de Mário Cesariny, evocando o
Primeiro Manifesto: "E para a idéia da Totalidade duma Vida Única nós
acreditamos na conjugação futura desses dois estados, na aparência tão
contraditórios, que são o Sonho e a Realidade. Acreditamos numa Realidade
Absoluta, numa SURREALIDADE, se é lícito dizer-se assim." (“A Afixação
Proibida”, Mario Cesariny de Vasconcelos)
(2)-Miguel de Carvalho, texto de apresentação da exposição.
Luiz Morgadinho, “Tudo vê – I”, 2013, acrílico s/cartão
telado. ©LM
Luiz Morgadinho, “Civilização”, 2012, acrílico s/tela. ©LM
Luiz Morgadinho, “Olhando o futuro”, 2012, acrílico s/tela. ©LM
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